O tipo de proteína e o tempo de sua digestão, interferem na força e hipertrofia?

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Durante anos, acreditou-se que o mecanismo mais importante para obter força era o treinamento, ou a atividade física. Indiscutivelmente, este é um dos fatores fundamentais para estímulo a tal, mas, não podemos, assim como descobriu-se de maneira observativa, a resultante disso, que é a produção de volume muscular, desde que, aliado a um terceiro e, talvez mais importante mecanismo de recuperação muscular: a nutrição adequada. Desta forma, com o passar dos anos e com a evolução não só no empirismo, mas no trabalho analítico, foram e são criadas cada vez mais estratégias nutricionais, as quais possam otimizar esses resultados que esperamos no período de recuperação. Uma dessas estratégias, pode ser entender o tipo de proteína que esta consumindo, seu tempo de ingestão e saber se elas irão interferir em nosso aumento de força e hipertrofia muscular.

Apesar das recomendações nutricionais serem bastante individuais, algumas generalizações devem ser feitas fundamentalmente buscando protocolos básicos e diretrizes para que, por cima disso, consiga de trabalhar dentro de uma menor margem de possíveis erros. Assim, recomendações gerais não devem ser completamente desconsideradas, mas, reestruturadas de acordo com cada necessidade individual.
Entre as recomendações mais básicas para o praticante de musculação, em suma, aos levantadores de peso, a maioria e mais atual gama de pesquisadores, sugerem de, em média, 1.5g-2.0g/kg de proteínas ao indivíduo, sendo que, o consumo calórico total é sugerido em torno de 44kcal/kg, podendo ultrapassar largamente esse valor, principalmente em casos de formação extrema (busca máxima por hipertrofia muscular) e/ou em casos de treinamento extremo.

L-Leucina como aminoácido fundamental para a síntese protéica

Sendo, para a hipertrofia muscular ser possível, que haja síntese protéica, então, devemos entender superficialmente, ao menos, como a síntese protéica ocorre, não é mesmo? A síntese protéica ocorre quando o metionil-transferência se liga a uma pequena subunidade eucariótica, dando início a um complexo de iniciação. Após algumas sinalizações, processos e outros, então temos a replicação do mRNA, ou RNA mensageiro, que nada mais é do que a cópia do DNA, transcrito em RNA.
A L-Leucina, por sua vez, representa uma das principais sinalizações na síntese protéica, na medida em que, estimula a mTOR, dando início ao processo de síntese. Além disso, o mesmo aminoácido em questão, interage com outra estrutura chamada Rheb. Quando a mTOR é ativada, ela fosforiza alguns complexos protéicos, como o 4E-BP1 e o S6K1. Este segundo complexo, por conseguinte, produz adicionais eIFs (também sinalizador da síntese protéica) que aumenta a translação de mRNAs, que possuem o código genético protéico.
Sendo então, a L-Leucina é fundamental no processo de síntese protéica, já podemos imaginá-la como de consumo fundamental, uma vez que, este é um aminoácido essencial, ou seja, que não somos capazes de produzir e necessitamos consumir de maneira exógena. Começou-se, por conseguinte, a cogitar a hipótese de que seu consumo de maneira suplementar (e não apenas essencial), deveria ser feito, a fim de aumentar a sinalização para a síntese protéica e, consequentemente, a própria síntese em si, fazendo com que os ganhos fossem mais efetivos. E durante anos acreditou-se nisso. Entretanto, hoje, sabe-se que, apesar da efetividade da L-Leucina, o que mais importará será um aporte protéico suficiente e, preferencialmente de proteínas de alto valor biológico e, completas, claro.
A suplementação exagerada de L-Leucina NÃO é eficaz na síntese proteica: clique aqui e confira! 

Os tipos de proteínas

Entre os mais frequentes tipos de proteínas de alto valor biológico que consumimos diariamente, estão presentes as carnes em geral (brancas e vermelhas), ovos e derivados, leite e derivados e os suplementos nutricionais, como whey protein. Além dessas fontes protéicas de alto valor biológico, ainda contamos com as proteínas de baixo valor biológico presentes em quase todos os alimentos que não são de nutrientes isolados, principalmente leguminosas como feijão, grão-de-bico e outros. Porém, sem sobra de dúvidas, uma das mais discutidas fontes protéicas que “revolucionou” (pelo marketing…) o conceito do uso de proteínas, está a soja. Apesar de seu questionável valor biológico, ela tem representado, em alguns estudos bons resultados diante a ganho de força e, claro, hipertrofia muscular e resultados ruins em outros estudos, visando o mesmo objetivo.
O valor biológico de uma proteína, está associado pelo que conhecemos como PDCAAS ou “Protein Digestibility Corrected Amino Acid Score”. Enquanto o valor biológico, define eficiência da absorção e utilização das proteínas, os PDCAAS definem numericamente o perfil dos aminoácidos presentes em uma proteína de acordo com a quantidade de seus aminoácidos essenciais.
Entre as melhores fontes de proteínas, está o leite, que é composto em termos protéicos, basicamente em 20% por whey protein e 80% por caseína. Seu valor biológico chega a 91 e a contagem de PDCAAS a 1.00, ou seja, classificação máxima. Já a soja, por exemplo, possui um valor biológico de 74, mas a contagem de PDCAAs chega a 1.00 também.
Um dos períodos que, até pouco tempo atrás, inclusive, era considerado o primordial para o consumo protéico, é o pós-treino imediato. De certa forma, não podemos desconsiderar sua importância e, levar em consideração a velocidade com que esses aminoácidos hidrolisados das proteínas entram na corrente sanguínea e, por conseguinte são distribuídos e utilizados. Apesar de certa necessidade de velocidade na absorção, esse não deve ser o fator primordial a se levar em consideração no pós-treino, pois, estudos mostram que tanto a utilização de caseína quanto de whey protein, na mesma quantidade, incrementaram resultados nos voluntários, diferentes dos que utilizaram algum tipo de placebo.
Comparando ainda, o consumo de leite com a soja ou alguma bebida com carboidratos, o leite tem se mostrado mais eficaz do que a soja e o carboidrato, no aumento de força, síntese protéica, hipertrofia muscular e também diminuição no percentual de gordura (provavelmente pelo ganho muscular). Aliás, se hoje, existem suplementos que são considerados absolutamente eficazes, esses são os protéicos de alto valor biológico e os aminoácidos.

Veja :  Nutrição clínica, esportiva ou comportamental?

Mas, como dito, o período pós-treino deve sim ser levado em consideração, mas, não mais como o fundamentalmente mais importante. Por quê? O assunto talvez seja um pouco mais complexo do que se imagina, portanto, serei breve ao explicar:
A proteína demora certo tempo para ser metabolizada e, por mais que ela seja ingerida em forma de aminoácidos (hidrolisada), seu metabolismo completo, até que participe da síntese protéica, demora algum tempo mais do que “imediatamente após o treino”, assim como, o período de recuperação, não acontece apenas imediatamente após o treino, mas nos momentos e dias subsequentes, desde que o estímulo do treinamento seja suficiente. (Maior intensidade representa necessidade de mais tempo de recuperação.)
Desta forma, ingerir quantidades suficientes de proteína, na realidade, de aminoácidos essenciais antes e após o treino é muito mais importante do que ingerir proteínas unicamente após o treinamento (com algumas exceções de estudos realizados referente ao whey protein), visto que, mesmo as proteínas ingeridas pré-treinamento estarão em fase, ou de digestão ou pelo menos de metabolização (utilização). Protocolos revelam que, consumir proteínas antes do treino é mais viável e importante talvez do que unicamente após.

O que se deve evitar ingerir antes e após o treinamento de força, para maximizar os resultados da eficaz e rápida absorção das proteínas?

Como sabemos, a digestibilidade requer processos enzimáticos, ou seja, o encontro dos devidos substratos com as enzimas responsáveis por sua quebra ou que promovem determinadas reações, como em um “encaixe de chave e fechadura”, como comumente é conhecido o termo. Desta forma, quanto mais substratos e, menos enzimas, mais tempo demorará para acontecer o encontro de todos eles com as enzimas em menor quantidade e, mais tempo demorarão, obviamente, as reações seguintes.
Alguns fatores devem ser evitados no período pós e pré-treinamento para então, obtermos o máximo de velocidade de absorção. Isto é importante, pois, no período pré-treinamento, não nos convém “alimento no estômago”, mas sim, substratos disponíveis no sangue para serem utilizados durante a prática esportiva. Além disso, ter alimentos no estômago, fará com que a digestão desvie fluxo sanguíneo para o aparelho gastrointestinal e, devemos lembrar que o músculo necessita de sangue para sua oxigenação durante a atividade física e, sangue em grandes (ou pelo menos maiores do que o normal) quantidades. Da mesma forma, no período pós-treino, não nos convém que a digestão demore para acontecer, visto que quanto mais rápido fornecemos nutrientes na corrente sanguínea, mais brevemente acontecerá a recuperação pela utilização dos mesmos.
Alguns desses fatores que podem interferir negativamente nesses fundamentos são:
– Consumo de lipídios (com exceção dos MCTs, lembrando que, eles NÃO possuem a mesma função que os carboidratos para serem utilizados no pós-treino);
– Consumo de fibras e/ou alimentos de difícil digestão – como carnes gordas e fibrosas – (o que dificultará o encontro das enzimas com os seus respectivos substratos);
– Ingestão de muito líquido;
– Ingestão de pouco líquido; e
– Ingestão de alimentos que podem ocasionar desconfortos gastrointestinais, como frutas (pela frutose e presença de fibras insolúveis), lactose, entre outros.
Portanto, atente-se a isso!
Conclusão:
Contudo, é possível dizer que a velocidade de entrada de aminoácidos na corrente sanguínea, variará de acordo com a proteína ingerida (ou as proteínas ingeridas, caso estejamos falando de mistura protéica) que, por sua vez, é resultado do tempo de esvaziamento gastrointestinal, sendo mais ou menos lentificado a proteínas mais ou menos necessárias de hidrólises (ou quebras entre as ligações peptídicas dos aminoácidos nela presentes). Entretanto, isso não necessariamente quer dizer que, para possuirmos bons resultados, devamos consumir proteínas de rápida absorção no período imediatamente após o treino, visando aproveitar a inexistente “janela das oportunidades”. Muito mais do que isso, a quantidade protéica de alto valor biológico e alto número de PDCAAs ingeridas durante todo o dia e, consequentemente dia após dia é o que realmente fará a diferença na obtenção ou não desses satisfatórios resultados.
Cabe-nos então, ao escolher a (as) proteína (s) ingerida (s) imediatamente após o treino, avaliar dois pontos: As necessidades individuais, que podem exigir determinados protocolos e, claro, a resposta fisiológica de cada indivíduo de acordo com o protocolo aderido, tendo mais ou menos prevalência a melhores resultados. Portanto, não se iluda com altos investimentos em suplementos ou protocolos que acabam custando por sua promessa de rápida velocidade de absorção.
Pequenos detalhes podem fazer grandes diferenças, portanto, conhecimento é poder. Buscando este conhecimento, conseguiremos cada vez mais obter o máximo de ganhos e assim, atingir cada vez mais e, mais rápido, nosso objetivo.
Bons treinos.

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